Você já teve a experiência de iniciar um trajeto e, em determinada altura do percurso, se sentir um pouco desorientado e não conseguir lembrar de como chegou até aquele ponto? Não sei como é para você, mas é relativamente comum para mim.

No antigo Oriente, havia o costume entre alguns povos de fazer um montão de pedras e utilizá-lo como um memorial, um lembrete de que algo significativo aconteceu. Assim, ao passar dos meses e dos anos, era possível cruzar com aquele montão de pedras e lembrar que algo especial aconteceu. Não seria muito prático levarmos pedras nas bolsas e mochilas, mas temos que reconhecer que esse costume antigo era uma maneira interessante de registrar momentos importantes e evitar entrar em piloto automático. Este texto que você está lendo é, para mim, como um desses antigos memoriais. Um marco de um momento especial, algo para ser revisitado no futuro e relembrar etapas da jornada de um podcaster.

Apaixonei-me em 1995 por uma descendente de japoneses. Em dezembro de 2003, desembarquei no Japão, casado e com um filho de um ano e dois meses de vida. Ainda me lembro da ansiedade, da tempestade de sentimentos no peito até o embarque e da sensação de “agora não tem volta” quando as rodas do avião deixaram o solo brasileiro.

Cheguei ao Japão com algumas poucas malas e um bocado de sonhos. Viemos com a intenção de ficar três anos, juntar recursos e voltar ao Brasil para fazer nossos cursos universitários e adquirir nosso apartamento. Aliás, essa história de vir para ficar três anos é motivo de piada entre a comunidade brasileira no Japão, já que para a grande maioria dos imigrantes essa meta é desconsiderada pouco tempo depois.

Desde que chegamos, já encaramos a crise econômica mundial, os impactos econômicos e emocionais do tsunami e, mais recentemente, a pandemia da Covid-19. Às vezes, custa acreditar que já se passaram vinte anos. Você pode estar se perguntando: “Mas o que isso tem a ver com podcast?”.

Cheguei ao Japão um garotão de 23 anos e com várias expectativas sobre a vida profissional e acadêmica. Ao decidir ficar no Japão por mais tempo, muita coisa mudou. Sonhos foram colocados de lado. Foi bem doloroso fazer uma avaliação da minha própria história quando cheguei perto dos 40 anos. Ao perceber que já havia percorrido quase metade da jornada da vida, fiquei mal. Senti-me frustrado e impotente. Comecei a imaginar que não havia mais nada a ser feito. Seria para sempre apenas um imigrante nas fábricas do Japão. Um carregador de caixas. Um simples apertador de parafusos.

Foi mais ou menos nesse período que o podcast entrou na minha história. Primeiro como ouvinte e, só depois, em meados de 2018, como produtor. Aprendi muitas novas habilidades e conheci várias pessoas legais envolvidas em projetos inspiradores. A experiência restaurou minha autoestima. Percebi que era capaz de aprender algo novo e de executar bem uma nova atividade que era também uma possibilidade de negócio e carreira. Mais uma vez minha caixinha de sonhos recomeçava a se encher. É por isso que tenho uma relação afetiva com o podcast. Reconheço o potencial que essa mídia tem de impactar positivamente não só o ouvinte, mas também o produtor.

Muita gente foi importante na minha caminhada e gostaria de lembrá-las neste primeiro texto, já que ele é um memorial. Começo com a menção à minha esposa, Raquel, aos meus filhos, Matheus e Nícolas, e à minha comunidade de fé. Eles sempre estiveram ao meu lado apoiando e incentivando. Leo Lopes com o saudoso “Alô Ténica”, muito do que sei veio das muitas e muitas horas investidas na escuta do programa. Marcos Soares (Instituto Alvo) e Regina Célia Barbosa (Instituto Maria da Penha), as primeiras pessoas que confiaram às minhas mãos e ouvidos projetos de produção de podcasts. Meus queridos amigos do Coletivo Podosfera Nipo-Brasileira, com quem compartilho alegrias e perrengues. Todas essas pessoas tiveram preciosas contribuições para a minha formação e me permitiram chegar onde cheguei: um microempreendedor, apresentador de dois podcasts, um tiozão realizando o sonho da graduação universitária, tendo várias oportunidades legais nos eventos e iniciativas da comunidade brasileira no Japão e que, neste momento, está escrevendo pela primeira vez na vida um texto para um canal de notícias especializado.

Gostaria de encerrar com uma frase de um poema do poeta e dramaturgo espanhol Don Antonio Machado:

“Caminante, no hay camino, se hace camino al andar” (Caminhante, não há caminho, o caminho se faz ao andar).

Não importa se você é alguém que está no momento bem resolvido e com um projeto super estruturado ou se você não sabe direito onde quer ir com seu podcast e nem sabe quais habilidades são necessárias para a jornada. Apenas comece a andar. O caminho se fará ao caminhar. As pegadas ficarão na areia. Os montões de pedras serão levantados na estrada. No futuro, quando você se perguntar: “Ôxi, como cheguei até aqui?“, terá uma rica coleção de memoriais que te ajudarão a relembrar cada conquista e vitória.